Imagem: Negative Space/Pexels/Reprodução
Comercialização
Cooperativas da agricultura familiar encontram no comércio local alternativas para vender na pandemia
Waldizar de Sousa não mede palavras para contar o que sentiu quando foi declarada a pandemia do coronavírus, em março de 2020: “Foi assim como se fosse um infarte”. Waldizar é presidente da Cooperativa Agropecuária de Senador Pompeu (Cosena), do município homônimo, localizado no Sertão Central do Ceará. Fundada em 1977, a Cosena tem hoje 129 cooperados. E foi necessário um esforço verdadeiramente coletivo para driblar a crise.
Com as regras de isolamento social para conter a disseminação do vírus, escolas foram fechadas e, no comércio, apenas o essencial pôde funcionar. Uma das principais clientes da Cosena, a rede pública de ensino, que adquire alimentos através do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), interrompeu as compras.
As vendas da cooperativa para a prefeitura pararam - mas os cooperados não deixaram de negociar. A Cosena trabalha principalmente com aves, suínos, frutas, verduras e mel. “Corremos para os mercados locais, regionais. O pessoal que cria também tinha uma clientela em volta de onde produz”, explica Waldizar. Com a redução da compra, os cooperados diminuíram a produção, recorreram às ferramentas digitais como o aplicativo WhatsApp e continuaram a vender.
A joia da coroa da cooperativa, no entanto, é uma loja própria de utensílios e insumos agrícolas. Lá, abastecem não só os cooperados como os demais produtores da região. Graças à loja, as contas da organização fecharam no positivo, mesmo com as dificuldades da pandemia e a redução dos lucros.
A Cosena, mesmo atendendo o PNAE, nunca dependeu do programa governamental para manter as portas abertas. Comparativamente, em 2018, relembra Waldizar, o faturamento da loja superou R$ 1,2 milhão. O PNAE, metade disso. Com a pandemia, o lucro da loja caiu um terço, mas o saldo se manteve no positivo.
“Já passamos bastante tempo só com a loja. Quando o PNAE surgiu, já foi uma coisa secundária. Nós não vivemos só do PNAE. PNAE é uma contribuição secundária porque ajuda a fazer a comercialização dos associados”, assegura o presidente da cooperativa.
A mais de 580 quilômetros dali, em Natal, capital do Rio Grande do Norte, a Central de Comercialização da Agricultura Familiar e Economia Solidária (Cecafes) tem atravessado a pandemia com uma experiência semelhante de exploração dos mercados locais.
“O momento inicial foi bem atordoante, isso ocorreu porque as cooperativas estavam com tudo preparado, frutas, legumes, hortaliças, para o fornecimento nas escolas”, explica o diretor da Cecafes, Ruberlânio Franco, “as cooperativas tiveram que buscar outras alternativas de comercialização”.
Com loja física sediada na principal área metropolitana do estado, a Cecafes, que representa 11 cooperativas, utilizou a produção, as plataformas digitais e uma experiência prévia em comércio direto com o consumidor final para estabelecer uma rede de distribuição com funcionamento diário.
Como houve redução da circulação de clientes, o delivery foi reforçado. “No início, a gente teve dificuldade de atender à demanda, eram muitos pedidos, assim, houve dificuldade com os entregadores, e a gente teve que fazer terceirização com uma empresa de delivery”, revela Ruberlânio.
Antes da pandemia, eles realizavam uma entrega semanal de cesta de produtos agrícolas. Durante a crise sanitária e o aumento da demanda, chegaram a realizar entregas diárias. Mesmo com a procura, naturalmente, não foi possível absorver toda a produção dos cooperados, que tinham preparado um volume suficiente para atender às escolas do PNAE.
O governo do Rio Grande do Norte, aliás, até preparou kits de alimentação para distribuir aos alunos. No entanto, por conta da perecibilidade dos alimentos, adquiriu apenas cinco tipos de itens produzidos pelos cooperados. Ainda assim, a ajuda de última hora ajudou a Cecafesa fechar o ano com as contas no azul.
Para 2021, tanto a Cosena, no Ceará, quanto a Cecafes, no Rio Grande do Norte, temem uma extensão da crise sanitária que dificulte ainda mais o trabalho dos cooperados. Waldizar explica que o problema, por exemplo, vai além do PNAE. Os insumos para a produção agrícola rarearam e ficaram mais caros. “Trabalhamos muito com suínos e aves e chegamos a um momento de não encontrar pinto para comprar”, afirma.
Isso não impediu a Cosena de planejar e investir. No momento, a cooperativa está concluindo uma instalação para fortalecer a avicultura e atender não só ao PNAE municipal e ao comércio da região, mas disputar o mercado estadual: “Estamos com abatedor de aves praticamente pronto. Com a certificação, queremos inclusive o mercado de Fortaleza”.
A Cecafes, embora continue voltada ao PNAE, já experimenta a expansão do serviço de delivery com a oferta do serviço em Mossoró, segunda maior cidade do estado potiguar. Em meio à crise sanitária, que adentra 2021 sem sinais de arrefecimento no Brasil, as duas cooperativas tateiam o mercado em busca de garantir não só saúde financeira dos negócios, mas assegurar que cooperativas e cooperados, neste cenário atual e nos vindouros, possam caminhar por conta própria, sem depender das compras institucionais.
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